O monumento do Outeiro da Cruz, localizado no canteiro central da Avenida João Pessoa, representa um marco evocativo da principal batalha dos colonizadores portugueses na luta contra a invasão dos holandeses no século XVII, que aportaram no Maranhão com o objetivo de domínio destas terras. Permaneceram quatro anos, de 1641 a 1644, quando foram expulsos após sucessivas batalhas, se constituindo em um importante capítulo na efetivação da colonização portuguesa.
Sobre sua História
No ano de 1621 os Estados Gerais da Holanda por não aceitarem a divisão do “novo mundo” entre Espanha e Portugal, criam a Companhia da Índias Ocidentais, com o objetivo de expandir suas ações conquistadoras. Em 1630 os holandeses invadem e dominam Pernambuco instaurando o governo de João Maurício, conde de Nassau-Siegen.
Dando continuidade ao movimento conquistador de domínio e exploração dentro do contexto da economia mercantilista, os holandeses invadem o Maranhão em 1641, ancorando seus 18 navios com dois mil homens a bordo na Ilha de São Luís na enseada do Araçagi. No dia 25 de novembro de 1641 aportaram no Desterro, em frente à capela que à época, aparecia na planta da cidade como capela de São Jorge e posteriormente Igreja de Nossa Senhora do Desterro.
O governador do Maranhão, Bento Maciel, não ofereceu resistência e entregou ○ forte de São Felipe ao ser preso, deixando a cidade sob o domínio do invasor holandês.
Com o domínio estabelecido, iniciaram um período de saques e pilhagens de casas e igrejas da cidade, exigiram fidelidade da população em geral ao Estado Holandês além da imposição religiosa do calvinismo. Parte da população com medo, se refugiou em propriedades do interior da capitania.
Os holandeses teriam se instalado na cidade em um casarão que serviu de base militar e residência do governador estabelecido Pedro Bas. A edificação, localizada ao final da Rua 28 de Julho, canto com a Rua de Nazaré, ficou conhecida como Palácio dos Holandeses. Hoje, o casarão não existe mais, pois na década de 1930, já em estado de ruínas, foi demolido pela administração municipal de São Luís.
Os holandeses seguiram para o rio Itapecuru, conquistando o forte do Calvário na cidade de Rosário e os engenhos daquela região, e estabeleceram o domínio da produção do açúcar, exigindo dos proprietários dos engenhos uma taxa em cima da produção. A fim de assegurar o cumprimento da ordem, deixaram cerca de trezentos soldados nessas propriedades.
Somente em 1642 os portugueses conseguirem organizar um movimento de resistência ao domínio holandês. Incitados pelos jesuítas e comandados por Antônio Muniz Barreiros Filho e por Antônio Teixeira de Melo, o plano inicial era a tomada dos cinco engenhos do Itapecuru, 0 que aconteceu em 30 de setembro de 1642. Após a tomada dos engenhos foi feita a ocupação do Forte do Calvário. Vitoriosos nessa etapa, seguiram para a Ilha de São Luís com o objetivo de tomar primeiramente o forte de São Felipe.
Para seguir tal planejamento Muniz Barreiros decidiu que a melhor estratégia seria primeiro montar um acampamento um pouco distante da cidade, já que os holandeses tinham sido prevenidos do que acontecera na região do Itapecuru. Acamparam na região do Cutim, às margens do Rio Anil, onde estabeleceram um posto militar e montaram várias emboscadas contra os holandeses. A batalha do Cutim, local que mais tarde seria conhecido como Outeiro da Cruz, aconteceu no dia 21 de novembro de 1642.
“Uma coluna holandesa de 120 homens, às ordens do capitão escocês Sandalim, sai para reconhecer o terreno e cai, quando pensava destroçar de surpresa o destacamento avançado do rio Anil, na emboscada do Outeiro da Cruz, perdendo mais da metade de seu efetivo, inclusive seu bravo chefe.” (Meireles, 2001, p.87)
Após essa batalha vencida no Outeiro da Cruz, Muniz Barreiros decide se entrincheirar na colina do Convento de Nossa Senhora do Carmo, local bem próximo ao forte de São Felipe, que era alvo. Fortalecidos com a vitória da batalha vencida no Cutim, a situação, favorável naquele momento às tropas portuguesas, melhora com a chegada de reforços vindos do Pará em 2 de janeiro de 1643, composto por 130 soldados e 700 índios. Os holandeses também receberam reforços de 775 homens em 15 de janeiro, vindos de Pernambuco. No dia seguinte da chegada dos reforços holandeses, 16 de janeiro, Muniz Barreiros morre e os portugueses passam a ser comandados por Teixeira de Melo, que decide se retirar da batalha no forte e acampar novamente no Outeiro da Cruz em 25 de janeiro de 1643. Uma nova emboscada preparada pelos portugueses pega os holandeses de surpresa na passagem pelo Outeiro. Houve represálias holandesas e Teixeira de Melo recua até Morupari, aldeia Taiassutina, entre as cabeceiras do rio Anil e Tibiri.
Seguiram-se outras batalhas até a expulsão definitiva dos holandeses no ano de 1644 e consolidação do domínio português no Maranhão. Os relatos de vários cronistas e historiadores e contexto nos mostram que foram batalhas travadas entre brancos colonizadores que se utilizaram em todos os momentos do braço indígena, usados como aliados tanto pelos portugueses quanto pelos holandeses que já exerciam o domínio na Província de Pernambuco, portanto, já haviam estabelecido um domínio aos povos originários daquela região.
O período de domínio holandês foi um período sangrento de muitas mortes de combatentes portugueses, holandeses e indígenas do Maranhão, do Pará, Ceará e Pernambuco, recrutados para tais batalhas. Nomes de indígenas que tiveram papel importante no comando de tropas portuguesas aparecem nos escritos de vários historiadores, como os indígenas Joaçaba Mitagai e Henrique de Albuquerque, da nação Morubixaba, que fortaleceram o exército de Muniz Barreiros, sem os quais teria sido muito difícil a vitória contra as tropas holandesas nas diversas batalhas travadas até a expulsão total do inimigo invasor.
O monumento evocativo do Outeiro da Cruz em memória aos que lutaram na batalha para a expulsão dos holandeses do Maranhão, está assentado em uma base de pedra com uma escadaria de concreto que dá acesso à cruz fincada em uma coluna anelada de mármore de lioz apoiada em uma base de três degraus, medindo o monumento da base ao topo cinco metros de altura.
Em uma placa de mármore está a inscrição:
“A tradição popular consagrou este monumento à memória dos bravos que ao comando de Moniz Barreiros e Teixeira de Mello expulsaram os hollandezes da Capitania.
30 – IX – 1642
21 – X1 -1642
26 – I- 1643
28 – II – 1644.”
A cruz fincada no local tem como objetivo rememorar a batalha ocorrida em 21 de novembro de 1642, que culminaria na expulsão definitiva dos holandeses do Maranhão no ano de 1644. A simbologia da Cruz é lembrar os mortos nessa batalha e a vitória dos combatentes portugueses. Mas é importante também a simbologia do domínio de um reino católico, visto que a religiosidade era elemento fundamental em todos os projetos coloniais. A Holanda, nação protestante, pilhou e destruiu várias igrejas, profanando seus símbolos. A cruz seria também uma demarcação da fé católica daquele reino que se estabelecia ali, o Reino de Portugal, um reino católico.
Até o século XIX encontram-se registros de que existia na cidade de São Luís uma tradicional festa de comemoração do aniversário da batalha do Outeiro da Cruz, mobilizando até o local grande número de pessoas que seguiam em romaria da região central da cidade e lá reverenciavam a Cruz para rememorar a vitória dos portugueses e saudar a Cruz em memória ao grande número de mortos dos combatentes que ali eram a vida em nome do Reino de Portugal.
A festa do Outeiro da Cruz, como era conhecida, era um importante evento da cidade que acontecia nos dias 21 e 22 de novembro para “celebrar a expulsão do domínio estrangeiro. ” Durante a festa de Nossa Senhora da Vitória, acontecia a procissão até o Outeiro da Cruz também em comemoração à vitória de Teixeira de Melo: “Amanhã festeja-se a Virgem na Cathedral havendo a procissão do costume, por ser o aniversário da victória alcançada por Antônio Teixeira de Melo contra os hollandezes cujo combate teve lugar no chamado Outeiro da Cruz A tosca cruz de madeira que ahi tem permanecido é lembrança piedosa à memória d’aquelles que ahi deram a vida pela sua fé e sua pátria.”
Além de saudar a Cruz aconteciam apresentações musicais com bandas mobilizando mais pessoas para aquele local. No final do século XIX, essa festa aparece como uma festa em declínio, mas que ainda por seu poder de mobilização havia um envolvimento do setor de transporte da cidade, a empresa Ferro Carril, que colocava à disposição da população que quisesse se deslocar até ○ Outeiro da Cruz, viagens para aquele local.
“[a empresa] manda no domingo de manhã ao Cutim carros e uma banda de música como recordação da festa que em outro tempo se fazia no Outeiro da Cruz. Neste dia há muito quem tenha por devoção curvar-se ao emblema da redempção, que ali existe, illuminá-lo á noite e juntar-Ihe a baze de flores,”
Ao final do século XIX, no ano de 1882 se inicia naquela região a construção de uma Ermida à Nossa Senhora de Nazareth. Até o início do século XX a festa de Nossa Senhora de Nazareth se torna uma das maiores festas católicas da cidade com a continuidade das romarias em direção ao Outeiro da Cruz para seu festejo que acontecia também no mês de novembro.
“Realisa-se no corrente anno, com o explendor do costume, a festa de N.S.de Nazareth do Outeiro da Cruz, por ventura uma das mais populares que se celebram na Iha de São Luis.”‘
A Igreja de Nossa Senhora de Nazareth recebia um grande número de pessoas e uma mobilização da administração pública em relação à garantia da segurança dos devotos, assim como da empresa de transporte da cidade, Ferro Carril, que aumentava o número de viagens dos bondes até o Outeiro da Cruz no dia da festa.
Esta Igreja, que estaria localizada próximo onde hoje está localizado o estádio de futebol, não existe mais, em estado de ruínas foi demolida no século XX.
Os registros em jornais baseados em documentos da administração pública municipal de São Luís apontam que a construção de um primeiro monumento para fincar a cruz ali é da primeira metade do século XIX.
No ano de 1845 a Câmara Municipal de São Luís solicita, dentre obras a serem realizadas no município, a construção de “uma Cruz de pedra ou qualquer outro monumento no Outeiro da Cruz. ” Tal solicitação é feita novamente no ano de 1848, também pela Câmara Municipal: “propõe, que para perpetuar a memória dos acontecimentos notáveis desta Província, se levante uma Cruz, cuja lembrança não posso deixar de aplaudir. “
No ano de 1877 há notícias de depredação da cruz ali já instalada e que, por ação de populares ou ação do tempo, a cruz estaria em estado lastimável de deterioração e necessitando passar por urgente reforma, bem como a estrutura na qual estaria assentada.
“No logar denominado Outeiro da Cruz apareceu hotem derribada a Cruz, existente, o symbolo rememorativo do grande combate, ali havido, em tempos passados, contra os holandezes, onde foram numerosas as perdas de vida. Não se sabe se uma tal circunstância é devida à malvadez, se à acção poderosa do tempo, não parecendo-nos dar-se esta, porque juntamente com a Cruz, parte da parede ou pilar em que ella assenta, também está por terra. Consta-nos que o cabo Parnayba, comandante do destacamento do Cutim, vai principiar hoje o concerto da parede e colocar outra vez a Cruz.
Obras de reestruturação da avenida do Outeiro da Cruz foram feitas no ano de 1848 com o “rebaixamento da calçada do outeiro da cruz” como forma de melhorar o trânsito do bonde da empresa Ferro Carril que fazia linha para o Cutim, com os trilhos, após esta intervenção, por traz da Cruz.
Outros registros afirmam ser o monumento do ano de 1901. Tal como aparece em jornal e afirmam alguns historiadores:
“O monumento do Outeiro da Cruz foi inaugurado em 1901, para homenagear os combatentes portugueses que tombaram no local e lutaram pela expulsão dos invasores holandeses do Maranhão. “
No ano de 1960 o local passa por uma reestruturação durante o governo de José de Matos Carvalho (1957 1961) por solicitação do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, com a construção de Praça do Outeiro da Cruz.
No ano de 1962 o referido monumento é noticiado:
“Monumento existente à praça do Outeiro da Cruz. Referida praça foi construída em 1960 (Governo Matos Carvalho) atendendo pedido do Instituto Histórico e Geográfico. Praça que hoje o mato vai tomando de conta pouco a pouco, Infelizmente.”